quinta-feira, 11 de outubro de 2007

A Balada da Morgue


Hoje venho apresentar-vos um grande amigo meu. De seu nome real Adolfo Correia da Rocha, nasceu faz este ano 100 conjuntos de 365 dias. É conhecido por todo o Portugal como Miguel Torga. É verdade que já morreu há uns bons anos, e que por acaso ganhou o primeiro Prémio Camões da história (falar-vos-ei mais sobre isto noutro post), mas continua a ser um meu grande auxiliar na minha arte de escrever.

Há uns tempos comprei um livro dele, "Poesia Completa, Volume I", e desde então não me tenho separado dele. Leio-o, releio-o, e volto a reler. Hoje, voltei ao segundo poema deste livro, e li-o com a extrema atenção. Chamava-se "A Balada da Morgue", e de imediato me lembrei que aquilo me fazia reflectir. Fazia-me reflectir sobre a importância da vida, e que a devemos aproveitar. Vou citar o poema completo, que vale por um post. Pensem nele e... reflictam!

Balada da Morgue
ao João Gaspar Simões

Olho este corpo aqui deitado
E sinto impulsos de beijá-lo e ter
Toda a força de beijá-lo
Com sugestões de prazer...

Que bruta sinceridade!
Que humildade!
Que vaidade!
Que mentira! Que verdade!
Todo nu! Eu pressenti-o
Dando desejo e fastio...

Não é de mulher, não é;
Nem d'homem; nem d'animal
Irracional:
É d'Anjo predestinado
Que foi sacrificado
Para dar a noção exacta da renúncia!...

Ai! Dos corpos metidos em sarcófagos!...
Ai! De quem morre vestido!...
Nesta luxúria da Morgue
Há todo o satanismo
Que nos foi prometido
No Final...

São os gestos parados;
Os olhos vidrados;
Os ouvidos tapados;
Os sexos castrados
E, por cima de tudo, o silêncio das boas!

Quero
Amar este sol da terra
Que mostra o calor do céu...
Anda aqui toda a loucura
Da razão que não morreu
Nos Sonhos dessa lonjura
Que nos fez, que nos perdeu...

Miguel Torga


Tiago

PS: Para quem gosta de poesia e de ler pequenos contos, visite o meu novo cantinho em que mostro os meus trabalhos no meu mundo... abram OS MEUS PERGAMINHOS! (http://www.osmeuspergaminhos.blogspot.com/)

14 comentários:

Aliice. disse...

Gostei desse poema que puseste aí no post. Mas também gosto daquelee em que tu cantas e que só se percebe o "refrão". xD

Tiago Mendes disse...

Aliice,
Esse de que falas é a "Primeira Lamentação" XD
Também gosto :) Aliás, será preciso dizer que gosto de todos!? :D

Obrigado pelo comentário ^^

Sol da meia noite disse...

Pois a importância da vida, está em nós a aproveitarmos.
De que nos vale a vida se a não aproveitarmos?...

O fim, chega. O ciclo fecha-se. Quer tenhamos aproveitado ou não. A oportunidade foi-nos dada.

Beijinhos!

Alexandre disse...

Falares aqui de Miguel Torga e especialmente de João Gaspar Simões - que ninguém conhece, infelizmente - é importantíssimo! E digo-te porquê: a literatura portuguesa até há pouquíssimos anos teve uma base rural, nenhum romancista escrevia sobre a vida nas cidades. Foi João Gaspar Simões que escreveu o primeiro romance urbano em Portugal: 1932 - "Elói ou o romance numa cabeça", obteve o Prémio da Imprensa.

Excelente post! Um abraço!

Tiago Mendes disse...

Sol da Meia Noite,
É como eu digo, numa das minhas frases mais "mórbidas". A cada passo que damos mais perto estamos do fim. Mas, se pararmos, continuamos a avaçar até ele. logo, mas vale continuar a andar e aproveitar a vida ;)

Obrigado pelo comentário :)

Tiago Mendes disse...

Alex,
Por acaso não sabia quem tinha sido João gaspar Simões, por isso obrigado pelo esclarecimento! Ainda bem que também gostas de Miguel Torga! :)

Obrigado pelo comentário ;)

Anónimo disse...

Se não fosse por tua culpa ( e olha que tens muita !!), nunca , provavelmente teria lido nada sobre Miguel Torga... sabia que ele era um poeta mas não tinha lido nada sobre ele... "A Balada da Morgue" é sem dúvida um excelente poema, na minha opinião um dos melhores e com uma óptima lição tal como dizes Tiago :
Devemos aproveitar a vida e não arrependermo-nos do que fazemos mas sim do que não fizemos!!

Continuação de bom trabalho!!!

Tiago Mendes disse...

Patricia,
Lembras-te do que te CANTEI hoje? Aquela canção, a segunda, do olhar para a frente e não para trás. o fado. É importante, e liga-se a isto. Pena que não tenha ficado gravada... :(

Obrigado pelo comentário ;)

Sei que existes disse...

Miguel Torga é uma excelente poeta! Gosto de o ler.
Beijinhos grandes

Sei que existes disse...

Miguel Torga é uma excelente poeta! Gosto de o ler.
Beijinhos grandes

Tiago Mendes disse...

Sei que existes,
partilhamos então do mesmo gosto poético! :D

Obrigado pelo comentário :)

eudesaltosaltos disse...

Olá. dcp a invasao. de Miguel Torga, aprecio mais a prosa, mas este poema faz-me recordar a sua forma de pensar, de escrever.. bj

Tiago Mendes disse...

Malucaresponsável,
é exactamente isso! A poesia de Miguel torga tem aquele toque... único, que só ele consegue dar! Aliás, penso que cada um de nós tem um toque especial na sua poesia! :D

Obrigado pelo comentário :)

Unknown disse...

Estou a ler a 'Criação do Mundo'. Até hoje nada tinha lido de Torga,a não ser umas coisas esparsas dos livros escolares recolhidas de algumas das suas obras. E reli alguns trechos dos 'Contos da Montanha,d'Os Bichos' etc com grande entusiasmo. E um poema sobre sobre S. Leonardo da Galafura que me encantou. Neste livro a que faço referência,no início encontro uma referência à "Balada da Morgue". Curioso fui investigar na NET e lá está esse belo poema sobre o niilismo arrepiante do ser após a morte.